ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial e à apelação da União, arbitrando,  ex offício , a verba honorária em dois mil reais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DEMISSÃO DE POLICIAL FEDERAL. CONTROLE JUDICIÁRIO DE LEGALIDADE. INFRAÇÕES PUNIDAS COM SUSPENSÃO. ANULAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. REINTEGRAÇÃO AO CARGO. PAGAMENTO DE VENCIMENTOS. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS DE ADVOGADO. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO IMPROVIDAS.

  1. Embora o poder disciplinar configure uma atividade tipicamente administrativa e envolva critérios, variáveis sujeitas à discricionariedade da autoridade pública, a intervenção do Poder Judiciário é admitida no controle da legalidade formal e material do procedimento (artigo 41, §2°, da CF de 88, artigo 150 do Decreto n° 59.310/1966 e artigo 28 da Lei n° 8.112/1990).
  2. O Departamento da Polícia Federal instaurou processo disciplinar contra E.B.M., porque ele e mais dois homens alheios aos quadros da repartição pressionaram o pessoal da recepção de E.J. Câmbio e Turismo, para que liberasse a entrada no estabelecimento e fornecesse documento de autorização de atividade financeira.

III. A pena de demissão não guarda convergência com os ilícitos cometidos, a ponto de ferir os princípios da legalidade, proporcionalidade e razoabilidade.

  1. A abordagem de um estabelecimento comercial sem mandado ou situação de flagrante delito e com a participação de pessoas de antecedentes desabonadores não se enquadra no inciso XLVIII do artigo 43 da Lei n° 4.878/1965 e do artigo 364 do Decreto n° 59.310/1966 – prevalecer-se, abusivamente, da condição de funcionário policial.
  2. Quando o extravasamento dos limites da função é ambientado em domicílio alheio, incide o inciso LXIII de ambos os artigos. A transgressão administrativa, em comparação com a delimitada pela autoridade julgadora, apresenta natureza especial, sobrepondo-se na atividade de interpretação.
  3. E.B.M. e os homens que o acompanhavam pressionaram o pessoal da recepção de E.J. Câmbio e Turismo, para que desobstruísse a entrada no estabelecimento e fornecesse a documentação regular da empresa. Ameaçaram invadir o local em caso negativo.

VII. O procedimento naturalmente ignorou as normas de inviolabilidade domiciliar, que prevêem, em tais circunstâncias, a exibição de mandado ou situação de flagrante delito.

VIII. A Lei n° 4.878/1965 institui para essa infração disciplinar a penalidade de suspensão (artigo 47, parágrafo único), sem que haja espaço a outra solução, à incidência de discricionariedade administrativa.

  1. O fato de o autor figurar como turista na ocasião, ou seja, sem a instrução de superior hierárquico e em local estranho ao Estado de lotação, integra o próprio âmbito do abuso. Ao intimidar a recepcionista na ausência de missão oficial, a desorientação funcional e geográfica condiciona o ilícito administrativo.
  2. A companhia de indivíduos questionáveis do ponto de vista moral e a abordagem abusiva do pessoal da recepção denigrem efetivamente a imagem da Polícia Federal, associando-a a relações de promiscuidade com informantes e a excessos de poder.
  3. Ambas as repercussões, porém, recebem qualificação própria, prevista nos incisos VII e LXIII da Lei n° 4.878/1965. O legislador institui a penalidade de suspensão para ambas as transgressões, sem que admita direção distinta.

XII. A demissão do autor por infrações a que a lei expressamente prescreve a pena de suspensão autoriza o Poder Judiciário a anular o ato administrativo, seja porque envolve a aplicação direta de norma jurídica – princípio da legalidade -, seja porque configura uma medida áspera demais para a natureza, a nocividade do ilícito praticado – princípios da proporcionalidade, razoabilidade.

XIII. A quantificação dos vencimentos e dos encargos devidos – correção monetária e juros de mora – desde a data do desligamento deve observar o Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal.

XIV. Em virtude da antiguidade do processo – 1997 -, da complexidade da causa e do fundamento da equidade que orienta as condenações contra a Fazenda Pública, os honorários de advogado devem ser fixados em R$ 2.000,00 (artigo 20, §3°, do Código de Processo Civil).

  1. Antecipação de tutela concedida para a reintegração imediata ao cargo.

XVI. Remessa oficial e apelação da União a que se nega provimento.

(TRF3. APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0000698-25.1997.4.03.6100/SP. Relator Desembargador Federal Antonio Cedenho)